
Pablo Neruda deixou três casas. Uma em Santiago, outra em Valparaíso e a terceira, onde viveu os seus últimos anos com Matilde Urrutia, a Isla Negra, por estar rocheada de rochas. Aproveitámos o domingo da viagem a Valparaíso para vir conhecer esta, a mais famosa.
A casa está desenhada, de certa maneira, como uma recriação da geografia do Chile, principalmente a parte isolada, dos escritórios. A parte da direita, principal, onde está a sala, repleta de elementos decorativos de navios, mascarões de proa (? tradução do espanhol "mascarones"), entre eles um, pequeno, de madeira, que representa uma mulher, semi-angélica. Nos dias de maior humidade gotas de água escorriam pela cara - "o meu pequeno milagre", chamava-lhe Neruda. Os temas náuticos mantêm-se na decoração da sala de jantar, junto à pequena cozinha onde nasceram poemas como Ode a La Cebolla ou Ode al Tomate. O quarto, no andar de cima, rodeado de janelas donde se vê todo o dia o mar e o sol, com a cama oblíqua á direcção do quadro, para que a cabeça estivesse onde nascia o sol e os pés onde este se põe.
A certa altura estou tão absorto que já me esqueci da mensagem que recebo com a notícia do golo do Porto ao Sporting. Tudo em Neruda é tão seu; é de poeta, é de uma genialidade. Ou, melhor, tudo parece ser tão simples e natural que essa é a sua genialidade.
Na outra parte da casa, estreita e comprida, como o Chile, são os escritórios. No jardim oposto ao mar vê-se um pequeno comboio, símbolo da sua infância e família - o pai era maquinista. Mais um espaço com janelas raiadas para o mar, este o dos escritórios. Colecções de fotografias de poetas que apreciava, para o inspirarem, e de navios em garrafas «contra o mar, para parecer que navegam», e de máscaras de todos os continentes. Cada divisão uma descoberta, descrito não é sentido. Urge ir lá, e sentir.
No fim, a sala do sul do Chile, da infância, da alegria. Mais colorida, esquece-se o mar. Lá está o cavalo de madeira, que Neruda desde pequeno admirava numa loja que o tinha como símbolo. Quando ardeu a loja e se salvou o cavalo, já o poeta era velho. Resgatou-o, trouxe-o para Isla Negra e preparou uma festa de boas-vindas. Amigos vieram com presentes. Três deles trouxeram caudas e penduraram-se as várias, uma na crina, de frente, outra de lado e uma atrás, claro. Assim nasceu «o cavalo mais feliz do mundo», por poder ter três caudas.
Cá fora, a âncora, gigante e oxidada, e os túmulos de Neruda e Matilde, la charcona (a despenteada).
E o mar, sempre o mar.
[a fotografia que não tirei - 150 fotografias em Valpo deixaram a máquina ko - e que me "obriga" a voltar lá para tirar]
1 comentário:
A fotografia não faz falta, porque o desenho está lindo e vê-se logo tudo perfeitamente... o mar, o céu, sol, areia, rochas... tudo! e o meu Manel, tão lindo e tão contente! E não havia ninguém que tirasse uma fotografia ao meu menino? Tou a ver que tenho que ir falar lá com alguém!!!
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