Saída sábado às dez da manhã. Chancho na Casa Suecia na sexta à noite. Opostos que não se atraem. Resultado - «'Tou Mico [tuga], acordei agora mesmo [10h], avisa aí que me meto num autocarro e vou ter com vocês a Valparaíso. Trata das minhas coisas no hostel, se faz favor.».
Fico meia-hora, ou mais, a tentar perceber se devia apanhar o bus na Estación Central ou em Los Pajaritos, e dou por mim noutra solitária viagem sudamericana. Acabo por sair na primeira estação de metro, mas a ter de andar a pé até à seguinte (!). Passado o primeiro percalço, logo outro; compro o bilhete, páro para comer duas empanadas - queso e pino, que é como quem diz queijo e carne - e atraso-me. Corrida para o bus, com este já em andamento a fugir do terminal. À Manel, dirão. À Manel, lá o apanho e entro.
Chegada a Valpo. Olhando para o mapa do meu guia, teria de atravessar a cidade inteira para chegar ao hostel Maison de La Mer, para onde atiraram os portugueses, enquanto todo o grupo ficava noutro hostel (?). Não pode ser, vá mas é de sair agora mesmo, nesta esquina movimentada onde o autocarro parou, e ir a pé, que é mais perto. Claro, em vez de perguntar ao motorista.
Pergunto no café em frente - «Calle General Mackenna? No, no sé. No hay ninguna.». Bonito.
Olho à volta, tento absorver o entorno (ambiente). Isto sim é Sudamérica. Avenida larga, solarenga. Feira improvisada no passeio. Gentes descedentes dos incas, tez escura, olhos rasgados. Feios, confesso. [E já me disseram que me misturo bem no meio dos chilenos, «pero un chileno guapo, super-bonito». Por supuesto.] Muitos cães vadios, espalhados ao sol, parecem mortos. São 25.000 perros para 275.000 pessoas. Vamos tirar o ar de turista; última espreitadela ao mapa e guardar o guia, preparar a pronúncia chilena (consiste em engolir os esses e as últimas sílabas e recorrer a alguns modismos que ficam para outro post). Lá está a Calle Mackenna, pequenina, ao lado da Avenida Ecuador. Pergunte-se por esta, então.
Depois de andar uma meia-hora, perguntando a direcção a cada 5 minutos para não me enganar, lá encontro a Calle. A pé, claro, para sentir este mergulho intenso em Valpo. O Lonely Guide descreve que é o segredo mais recentemente revelado do Chile, mas que há muitos que não o entendem por ser uma cidade suja, desordenada, cheia de fios eléctricos no meio dos prédios, e construída em Cerros, que dificulta a deslocação. Cerro, ou colina, que no caso se chama Yungay, e vou ter de subir quase a pique para chegar à Maison de La Mer. Malditos cerros, chego morto ao hostel. Mudo de roupa e vá de ir ter a um restaurante onde estão os portugueses. À saída do hostel a primeira rendição a Valpo, aos cerros, a tudo, como deve ser perceptível. Afinal, é Património Mundial da Unesco desde 2003.
Outra meia-hora a andar, agora mais bem disposto. E bem disposto agora a parecer mais turista. Vá de sacar da máquina a apanhar alguns aspectos de Valparaíso. Entre eles, este mini Flat Iron Building. [comparar com o original aqui.]
Lá encontro os portugueses, no restaurante Porto Viejo. Marisco e peixe, finalmente. Com eles, ou connosco, está o Stefan, alemão que já cá está há um semestre e que organizou a viagem. Não sei se para compensar termos de ficar noutro hostel, decide quedar-se com o povo tuga durante a viagem. Para o grupo de Camões ficar completo faltam duas raparigas, que juntaram à viagem a Valpo uma excursão a Viña del Mar. Há-de ficar para outro dia, para mim.
Corremos um pouco Valparaíso, depois de uma larga - e barata - almoçarada, à portuguesa. Uns 5000 pesos, ou 7 euros, a cada, para mim menos que cheguei mais tarde. A luz do sol vai fugindo mas ainda a apanhamos ao subir a um cerro, num dos muitos e típicos ascensores da cidade.
Lá de cima. O contraste entre o porto e os Cerros. A luz e as sombras. O dia e a noite.
Paragem nos dois hostels do grupo para reunir, viagens a pé e de táxi pelos cerros e por El Plán, a zona plana da cidade claro está. Ah sempre que o carro tinha espaço, era de esperar que o taxista apanhasse mais alguém para rentabilizar os lugares. Depois, jantar na típica tasca Jota Cruz (lê-se "róta cru"). Espaço chiquito, para 50 pessoas, não mais, com mesas corridas e que se partilham com quem aparecer. Só há um prato, La Chorrillana - batatas frita, cebola, carne e ovo mexido. O fígado adorou. É servido em travessas e cada pessoa pega num garfo e serve-se. Experiência sudamericana, mais uma, forte, em Valpo. A decoração é castiça; objectos, fotografias e escritos que as pessoas por lá deixam. Ao lado da nossa mesa a fotografia de um português que tínhamos encontrado com a namorada no cimo do cerro (!). Hei-de voltar e deixar a minha marca, dada a falta de caneta ou fotografia na altura.
[o grupo tuga de Valpo quase completo;
da esquerda para a direita - Chico, Manel, Bernardo, João, Diogo, Mico e Miguel]
À noite, fiesta no El Huevo, a discoteca da moda da cidade. [conselho, não levem máquina fotográfica para uma discoteca; foram mais de 150 fotografias em algumas horas, muitas delas a nada, ou chão, pés, costas, luzes]
Dia seguinte é só despertar e partir para Isla Negra, onde Neruda deixou a sua casa mais conhecida (outras em Valparaíso e Santiago que ainda não visitei) e o seu corpo, junto ao mar.
Sem dúvida voltarei, voltaremos, ao Vale do Paraíso.
Sem comentários:
Enviar um comentário