7 Meses na América do Sul

A PUC de Santiago, o Direito chileno, o pisco e as empanadas, os Andes, o Pacífico, a Sudamérica, Rapa-Nui ... enfim, La Libertad.


20.8.07

39 Curvas

Noite mal dormida, frio que se faz sentir em cada centímetro de pele. Porquê o sacríficio, porquê o afastar do conforto, porquê não deixar só a mera existência passar por nós, porquê a insistência em ir lá fora viver?

O sono desaparece com o gelo, primeiro toque do gelo, este primeiro como adjectivo da água do duche. O quente não é suficientemente quente.

O primeiro contacto com os portugueses. Entusiasmo pela jornada que começa. O grupo é grande, vária é a experiência de neve.

39 curvas. Curvas de 180º, com forte inclinação. 1.30h, que se transformam em duas, e chegamos a Valle Nevado.

A aula de snowboard, incluída no pacote da viagem, é despachada num terço do tempo previsto. «Vocês já sabem fazer, podem ir». A alegria de descer as pistas e sentir, mas não sentir, o frio. Ele está lá, mas a adrenalina, a concentração, a antecipação das manobras, fazem com que não esteja. E fazem com que valha a pena ser mais do que só uma existência nesta Terra, nesta Sudamérica.

Depois do almoço, a descarga de testosterona. A procura do mais além - um fora de pista. Talvez além demais, porque a certa altura não se pode descer, nem subir no saca-rabos. «Son de El Colorado, no pueden subir» Há que subir... a pé, e com a prancha às costas. Mochila de skater que me salva, com suportes para a tábua. Mas a neve, a neve fofa, convidativa a dormir, tormento para quem a quer atravessar, enterrando-se até aos joelhos. Sempre são 3000m de altitude - impossível fazer mais do que 10m de cada vez. Lembrar-me de João Garcia (esta é a minha mais alta solidão). O grupo segue separado, mas sempre todos à vista; é a solidariedade tuga que evita que alguém fique para trás. Mais de uma hora depois da descida o reencontro da pista. O alívio.


Descansa-se e desce-se mais pistas. Vive-se mais.

Acontecimento fortuito - trocam a minha prancha, desaparece. Alerta-se a polícia e a loja de equipamento. «Está uma parecida nos suportes de onde desapareceu a tua? Usa essa, não te preocupes» Espírito tranquilo, mas também prático, já que 90% do material nas pistas deve ser desta loja, tudo lá irá parar

Mais um tempinho, mais pistas, mais vontade de viver. E voltar.

No fim do dia, com o Sol já fugido dos Andes para o Mar, o cansaço acumulado não impede o sorriso nos lábios meio gretados, e a cabeça livre. De certeza que volto. Afinal, são só 39 curvas.




1 comentário:

Anónimo disse...

Longe da vista, longe da preocupação? É um bocadinho verdade! Tento não ler nas entrelinhas as possibilidades menos boas, e concentrar-me só nas felizes... é um exercício por vezes difícil! Boa, Manel, insista em "ir lá fora viver"!!!!